Patinho feio (ou bonito) – 1a parte de 3

Relutei muito em falar sobre esse assunto, afinal ele sempre correu solto em meus inúmeros dilemas existenciais.

A beleza ou falta dela determinou muito da minha forma de ver o mundo e acabei desenvolvendo uma teoria própria sobre a psicologia da beleza. Vou apresentar essa visão em 3 textos para que nada se perca nessa emblemática jornada narcísica.

Fui uma criança normal e despreocupada nos meus primeiros anos de vida. Tenho memórias muito remotas e sei que pouca coisa realmente me preocupava.

Professorinha?

Por volta dos 5 anos sofri uma queda na escolinha e meu dente da frente ficou levemente escurecido. Ali começou o dilema, jamais olharia para o espelho desatentamente, ainda que eu não o alcançasse.

Vendo um vídeo recente de aniversário de criança percebi que sob o foco da câmera eu (encabulado) imediatamente escondi meus dentes com a boca. Passei a ver a mim mesmo de forma anormal, eu era apontado quando sorria. Foi terrível, mas ainda não seria tudo.

Na adolescência aquela fase do estirão causou no meu corpo o efeito gafonhoto: pernas, braços e orelha grandes e tronco e rosto pequeno. Acrescido a isso descobri aos 12 anos minha miopia hereditária. Fora a miopia minha mãe querida não me poupou herdar algumas armações de óculos não mais utilizadas pela minha irmã mais velha. Resultado: mico absoluto!

Mais uma vez minha autoimagem seria marcada por inúmeros apontamentos que evidenciavam o quanto eu era dentuço, magricela, quatro olhos e resumindo, feio, sim FEIO. A minha  vontade de desaparecer se fazia perceber na minha corcunda habitual e peito para dentro. Me lembro de ouvir meu pai sempre me alertando para andar com o peito para fora e a cabeça erguida. Meu corpo desajeitado tornou-se desengonçado, o temor de sempre tropeçar fazia com que eu andasse como o Sasá Mutema.

Passei a minha adolescência me escondendo de situações de grande exposição pública. Festas eram terríveis, quando não tinha escapatória eu ficava num canto tomando refrigerante e rezando para que ninguém olhasse para mim. Isso já me livrou de muitas bexiguinhas d’água na cabeça.

O fato de fazer minhas buscas espirituais me trouxe uma acalento, pois ali eu poderia ser reconhecido pelo que sou e não pelo que eu aparentava. O destaque intelectual e minha generosidade juvenil me fizeram ganhar a simpatia das pessoas. Lentamente  fui mostrando um pouco mais de mim e me tornei palestrante e professor muito jovem, aos 19 anos. Nessa época os aparelhos ortodônticos foram meu pesadelo.

Entrei na faculdade e um pouco do terror da adolescência me assombrou, nenhuma namorada na minha carreira de 20 anos de idade. A feiúra era um motivo mais que justificado para mim.

Aos 22 anos fiz a cirurgia corretiva da miopia e tirei o aparelho dos dentes. E passei por uma mutação digna de Betty, a feia. Minha primeira namorada, minha amiga até então, viu algo em mim. Mas por quase 5 meses não acreditei que ela gostasse de mim e a recusei, mesmo sob declarações. Algo dentro de mim dizia que ela estaria caçoando. Mas com o tempo cedi aos encantos e apelos dela, dali em diante não fui mais o mesmo.

Suas declarações apaixonadas sobre minha beleza foram pouco a pouco derretendo a casca que criei em torno de mim. Devo isso a ela!

No próximo texto falarei sobre como a feiura pode interferir no desenvolvimento psicológico de uma pessoa.

E no último texto sobre como a beleza pode afetar uma pessoa em sua personalidade. Sim, os belos também sofrem.

Patinho feio (ou bonito) – 3a parte de 3

Patinho feio (ou bonito) – 2a parte de 3

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About the author

Sonhador nato, psicólogo provocador, apaixonado convicto, escritor de "Como se libertar do ex" e empresário. Adora contar e ouvir histórias de vida. Nas demais horas medita, faz dança de salão e lava pratos.

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