O que é humildade?

Já recebi essa pergunta e me fiz muitas vezes, afinal o meu pecado mortal é o orgulho. Há cerca de 14 anos coloquei na minha cabeça que iria tratar o orgulho com um vigilância especial para que eu não me perdesse de mim.

A humildade, portanto, tem sido alvo de minhas pesquisas psicológicas pessoais e profissionais por tempo considerável. Acho que agora posso falar um pouco sobre isso sem me condenar por achar que só poderia escrever algo sobre o tema quando já tivesse superado essa trava emocional.

A humildade é um processo psicológico que possibilita uma pessoa a olhar a si mesmo e os outros numa perspectiva realista, nem mais e nem mais do que é, no entanto não é uma qualidade única, mas um feixe de qualidades que a compõe.

A palavra vem de humus, no latim “filhos da terra”, e essa acepção é bem próxima do meu entendimento sobre o assunto, pois a humildade é algo que deixa uma pessoa absolutamente conectada ao mundo como ele é e não como gostaria que fosse.

Normalmente existe um engano comum em associar humildade a uma história de pobreza, miséria ou perdas e até mesmo confundi-la com aparência maltrapilha e descuidada. Quando a pessoa diz que veio de uma origem humilde na realidade ela diz que veio de uma origem pobre e não humilde. Pobres podem ser orgulhosos e ricos podem ser humildes, pois diferente do que algumas religiões pregam humildade não é patrimônio exclusivo de nenhuma faixa sócio-econômica.

Também desconfio do esteriótipo simplista da pessoa de fala mansa, passiva e que sempre está disposta a fazer tudo por todos sem critério. O orgulho pode estar presente em falsas manifestações de humildade, pobreza, gentileza e posturas pretensiosamente anti-capitalismo/dinheiro/beleza/fama/sucesso/prestígio/beleza/padrão/. Penso ser bem enganoso a ideia de se apartar de um determinado mundo de coisas a pretexto de ser diferente e humilde. A humildade como a entendo pode estar presente em qualquer contexto ou condição de vida porque ela não é uma bolha fechada que não se mistura por medo de se manchar, ela está onde quiser e puder estar. A ideia de criar uma comunidade de pessoas humildes já é em si arrogante pois concebe pessoas privilegiadas em relação a outras que precisam ser ajudadas.

Um bom critério para separar o joio do trigo é perceber se aquela ação é mobilizada por um desejo aparente ou secreto de superioridade com um fim em si mesma, meramente para gerar uma sensação de autoengrandecimento que tenha como consequência exclusivamente a pessoa em questão.

Das características que compõem a humildade enumero algumas como:

– Bom senso: arte delicada de perceber o que o contexto pede. Momentos de ação pedem movimento, de silêncio requerem quietude, de ardor apelam para a intensidade. O clichê da pessoa rigidamente moderada pode ser enganosa.

– Estamos todos no mesmo barco: o sentimento de que estamos todos implicados de modo geral é própria da pessoa humilde, afinal a ideia de distinção ou privilégio é próprio do orgulho.

– Abertura: a habilidade de olhar para as pessoas sem a necessidade de julgar e hierarquizar a realidade a partir de uma moralidade cega. A pessoa pode tirar uma conclusão dos fatos sem necessariamente depreciar o que enxerga e se autoproclamar superior.

– Realismo: olha o que é como o que é sem tentar fansear a percepção achando que o próprio desempenho o melhor do que realmente foi e nem pior do que de fato foi.

– Apreciação do simples: a simplicidade é o óbvio, aquilo que está aqui e agora diante de você, seja uma mansão ou um iô-iô.

– Gosto pela vida: pela postura de querência pela realidade como é, mesmo as mais difíceis situações são olhadas com certo sabor de curiosidade e apreciação. A morte ou a perda de alguém é sempre um laboratório emocional para si mesmo onde permite que se teste os limites de suas emoções. Não se revolta, afinal não tem a prepotência típica de quem acha que é privilegiado.

– Sustenta paradoxos: sabe que é uma pessoa única, no entanto, sabe que não é privilegiada ou especial. Percebe que amanhã depende de hoje, mas não vive hoje como se não houvesse a continuidade do hoje que vira o amanhã. Ela sabe que tem uma personalidade e, no entanto, sabe que isso é uma ideia que construiu de si e que pode ser apenas o apego de algumas ideias sobre si mesma potencialmente capazes de serem mudadas.

– Percepção da conectividade com os outros: sabe que não está só e isso cria uma pertencimento a espécie humana que cria condições para a generosidade.

– Relação de interdependência: não alimenta a ideia falsa de que não precise de ninguém e nem que a única forma de ser realizada depende exclusivamente de outros. Esse paradoxo de saber-se dependente e independente dos outros é uma filosofia que permite a essa pessoa entrar em sair de relacionamentos superficiais e profundos com um sentimento de liberdade e ao mesmo tempo dependência.

– Reconhecimento de si e do outro: sabe da importância que cada ser nesse planeta possui e ela não está excluida disso.

 

Acho que eu teria outras coisas a falar sobre o assunto, mas por hora é isso que me veio a mente.

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About the author

Sonhador nato, psicólogo provocador, apaixonado convicto, escritor de "Como se libertar do ex" e empresário. Adora contar e ouvir histórias de vida. Nas demais horas medita, faz dança de salão e lava pratos.

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