Amor para a vida inteira

* Por Frederico Mattos

Quando minha avó falava da vida inteira eu pensava, muito, muito velho. Mas imagino uma geração de pessoas que viviam até os 60 anos o que era a vida inteira. Além do mais eles viviam numa fase que não tinha tanta correria e tudo online, o tempo se desdobrava em outra dimensão, um dia durava três.

3725810

Hoje num dia cabem quatro ou cinco e podemos assoviar e chupar cana, nada contraditório. Fora a rapidez temos múltiplas escolhas o tempo todo e todas elas parecem dar num lugar bom, ainda que seja na nossa cabeça fantasiosa.

Quando alguém diz que acredita em amor para a vida inteira eu só posso ouvir isso como uma licença poética e achar bonitinho. Ninguém pode de antemão afirmar que alguém é o amor de uma vida inteira por alguns motivos.

O primeiro motivo é o amor não pode ser datado. Na prática quer dizer que não podemos garantir que uma coisa não mensurável garantidamente tem ou não um prazo de validade. Seria como tentar prever o clima com dez anos de antecedência. No máximo você faz aproximações meteorológicas, mas certeza, certeza mesmo só na hora que o sol aparece ou a chuva cai. Com o amor é assim, você declara uma intenção, mas garantir o amor que é um sentimento posto em prática não dá. Só em filme.

O segundo é que vida inteira é muito tempo. Ainda que se pudesse dizer que o amor duraria não podemos nos garantir por uma vida inteira do ponto de vista biológico até. Quantos anos viveremos? Um? Sessenta? Sei lá! O que vai acontecer até lá que me garante algum tipo de certeza existencial infalível? A ideia de que um amor valeu a pena pela longevidade que teve é um engano sem fim e que não comprova nada a não ser que duas pessoas se mantiveram perto uma da outra por muito tempo. Não podemos garantir que houve crescimento, amadurecimento e felicidade. Houve proximidade e a preservação de uma laço conjugal e familiar, mas felicidade não podemos garantir.

O terceiro é que não nos preservar os mesmos por uma vida inteira. Esse é o ponto mais delicado que os românticos tradicionais resistem a aceitar, nós mudamos. Em mais de pretensos quarenta anos juntos quantos renascimentos pessoais enfrentaremos? E como entre esses renascimentos podemos garantir que a associação com certa pessoa se manteria ainda produtiva, viva e geradora de crescimento e maturidade? Nas múltiplas mutações inevitáveis da outra pessoa também estaríamos correndo o risco de criar impasses para o desdobrar do seu melhor novo momento.

A solução que muitos encontram para sustentar a ideia de um amor para a vida inteira é: não mude, não ouse, não deseje e não morra. Para seguir nessa pretensa jornada de longevidade tentamos um ato homicida e suicida que é castrar certa mutabilidade própria da existência humana.

Com isso tudo não quero dizer que relacionamento longos e duradouros estejam fadados à paralisia. Para se predispor a manter um relacionamento realmente vivo e produtivo as pessoas envolvidas no relacionamento precisam ter em mente que esse espaço de desenvolvimento mútuo é fundamental e desejável. Nessa hora precisarão caminhar sempre lado a lado no abismo do vínculo que nutrem para que alinhem com certa frequência que rumos a vida vai tomar e onde as histórias se entrelaçam ou distanciam.

Sem essa sabedoria todo o “amor para a vida inteira” começa a naufragar logo de cara quando nos primeiros sinais de divergência alguém tenta moldar o outro para se adequar no seu projeto de casamento perfeito. Nessa castração inicial já se anuncia o que ali adiante será causa de desastres quando o casal se verá em bifurcações pessoais incompatíveis com o projeto comum.

Eu quero ter um amor para a vida inteira? Não, mas um amor que eu possa escolher a cada dia ser o melhor no dia de hoje.

_____________

para venda do livro 2

___________

Avatar fred barba* Frederico Mattos: Sonhador nato, psicólogo provocador, autor do livro “Como se libertar do ex” [clique aqui para comprar] e “Mães que amam demais”. Adora contar e ouvir histórias de vida. Nas demais horas cultiva um bonsai, lava pratos, oferece treinamentos de maturidade emocional no Treino Sobre a Vida e se aconchega nos braços do seu amor, Juliana. No twitter é @fredmattos e no instagram http://instagram.com/fredmattos

About the author

Sonhador nato, psicólogo provocador, apaixonado convicto, escritor de "Como se libertar do ex" e empresário. Adora contar e ouvir histórias de vida. Nas demais horas medita, faz dança de salão e lava pratos.

Related posts