Aceitar o inaceitável

*Por Frederico Mattos

Ninguém que pisou nessa Terra pôde se ver livre de lidar com dores difíceis, perdas delicadas e frustrações viscerais. A pobreza, a doença, o fracasso, a perda e a morte nos rondam a todo momento.

De alguma forma cada pessoa encontra seu jeito de evitar lidar com essas questões. Alguns trabalham ininterruptamente, outros acumular pertences e bens, há os que tentam injetar alegrias e eventos o tempo todo e também aqueles que se apagam emocionalmente para não sentir nada.

Me lembro de uma mulher que atendi que não conseguia aceitar a morte de seu jovem filho em um acidente de moto. Pelo menos dez anos tinham se passado do desastre e ela desenvolveu um comportamento raivoso, agredia a todos e sentia sempre no direito de colocar o dedo na ferida de qualquer um que quisesse se aproximar mais dela. Culpava o marido pelo acontecimento por ter presenteado o filho com a moto, e isso levou eles a um divórcio bem problemático. Essa mulher se tornou um espinho ambulante oscilando entre envenenar a si mesma com muita piedade de si e aos outros repassando a dor que sentia.

Ela me buscou tentando entender o motivo daquela tragédia, a racionalização era o jeito que ela buscava para driblar a dor. Fiquei me perguntando por que ela insistia em fazer terapia comigo, na época com vinte e sete anos, talvez visse alguma conexão com seu filho. Estranhamente eu era a única pessoa e terapeuta que ela não havia atacado ou desqualificado. Dizia que ninguém entendia sua dor, e mesmo eu dizendo que não entendia também ela não me atacava.

– Não sei dizer ao certo – disse para ela em certa ocasião – se a morte nos convida a entender seus motivos. A morte me parece ser uma mãe bem discreta que surge, abraça seus filhos silenciosamente e os alivia das obrigações dessa vida. Não me parece muito perspicaz perguntar para uma mãe o motivo de ter feito o que fez pelo seu filho, ela simplesmente faz algo e contemplamos. Existem coisas para as quais precisamos colocar os pés no chão e simplesmente olhar como são.

Ela nunca tinha pensado na morte como uma mãe e disse que uma mãe nunca enterraria o seu filho.

– Mães fazem coisas muito difíceis pelos seus filhos – continuei – e seus motivos são insondáveis. Mas a cada vez que brigamos com aquilo que não temos controle parece que perdemos força ao invés de ganhar. A força vem de uma dose de aceitação daquilo que está alem de nós. Quando aceitamos aumentamos de tamanho, mas quando brigamos com a realidade diminuímos, pois brigamos com as forças da vida.

Tivemos outras tantas e muitas conversas, mas ela disse que essa em especial a tocou profundamente.

Olhar a morte como uma mãe, relatou-me tempos depois – me fez sentir que meu filho estava bem cuidado e que eu precisava seguir em frente, ele nunca teria gostado de me ver agindo como uma doida varrida.

A realidade dolorosa que teimamos em aceitar é como aquele momento da colheita que vem recolher seus frutos para abrirem espaço para outra nova estação. Deter o fluxo da vida, brigar com os acontecimentos incontroláveis só traz ansiedade, aflição desnecessária e perda de força.

O único caminho para lidar com o inevitável é manter os pés no chão, com menos certezas, presunções e arrogância, seguindo em frente, ainda que mais lentamente…

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* Frederico Mattos: Sonhador nato, psicólogo provocador, autor dos livros Relacionamento para leigos (série For Dummies)[clique], Como se libertar do ex [clique aqui para comprar] e Mães que amam demais. Adora contar e ouvir histórias de vida. Nas demais horas cultiva um bonsai, lava pratos e se aconchega nos braços do seu amor, Juliana. Oferece treinamentos online de “Como salvar seu relacionamento” e “Como decifrar pessoas” No Youtube seu canal é o SOBRE A VIDA [clique aqui] No twitter é @fredmattos e no instagram http://instagram.com/fredmattos – Frederico A. S. O. Mattos CRP 06/77094