O que eu acho sobre o que eu acho

* Por Eduardo Benesi

“O que eu acho sobre o que eu acho.” Era assim, a manchete , ou chamada, não lembro mais, sobre um artigo de um colega de site falando do seu desgosto por BBB. Taí, exercício dos bons, faço isso de vez em quando, mas nunca havia percebido, pensar sobre o que eu penso sobre as coisas. Hermético?

Repare, não falarei sobre o conteúdo da discussão, mas sobre o ato de discutir. Confesso, sou extremamente tímido para me colocar em discussões virtuais sem ter tido o mínimo de estudo sobre a pauta abordada. Tenho lido diversos compartilhamentos sobre o tema/meme da vez “rolexzinho”, e refletido bastante sobre quem são essas pessoas (corajosas) que se jogam em ardidas discussões para assim desconstruirem uma ideia injusta sobre algo. Pensando na população do meu Facebook, 80% das pessoas de classe média – contando aqueles amigos que fazem a linha humilde fake “não tenho dinheiro” , e esfregam a suposta independencia por morar sozinho na cara dos outros , só que em certos casos com o papi patrocinando – constatei algo que muito me intriga: muitas, na verdade a maioria (da minoria) dessas pessoas costumam agir de uma forma curiosa sempre que um tema entra nos informais sabores dos tribunais virtuais.  Pensando num perfil  tragicamente humorado, não necessariamente esse,  que come cebolas gigantes aos fins de semana e coloca foto disso no instagram, gente crescida nas praças de alimentação aos domingos, com pais workaholics, membros da classe média que sofre, que deixam a tv ligada no canal 5 (até na hora de dormir) quase como um piloto automático padrão e possuem “banheiro de empregada” em casa. Pois então, é muito comum ver amigos, colegas, anônimos crescidos ou praticantes deste contexto travando um severo apontamento aos que por preconceito, pós conceito ou ignorância são resistentes a frequencia de pessoas mais pobres e “mal encaradas” nos shoppings centers.

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Por muito tempo, achei essas pessoas chatas, cheias de subversões ocas já que na prática, na vida real, elas não eram exatamente aquele poço de civilidade propagandeada em suas timelines. O interessante de tudo é que eu sempre, apesar de nutrir certa preguiça, lia tudo o que elas postavam, e era voyer das discussões que elas compravam. Tinha um sentimento estranho por esses coleguinhas virtuais:  me sentia o objeto criticado mas ao mesmo tempo lia coisas absolutamente razoáveis, concisas, e cheias de argumentos que me agradavam, que me pareciam ponderados, que me libertavam dos meus egoismos confortaveis. Sentia culpa e inveja, culpa por me perceber alienado e me sentir acusado de coisas que até ontem eu nem sabia que eram graves, e inveja deles por em nenhum momento ter sáido desse estado hamster, de ter tido a astucia de saber desviar das imposições subliminares e elitistas do sistema em que eu vivo.

Hoje esse sentimento se transformou, finalmente vejo que a falta dessas pessoas em redes sociais culminaria em uma catástrofe ou em uma ditadura oculta sem oposição, já que estariamos esmagados apenas pela preguiçosa opinião unilateral de uma maioria, ou de um eixo de manipulação. O que essas pessoas fazem é mais do que corajoso:  elas protagonizam mudanças de realidade dentro de uma guerra ideologica que já existe, e que é uma ferramenta consolidada, que é uma praça de guerra confortável e ao mesmo tempo invasiva. A elipse, a falta de quem “da o avatar a tapa” é um perigo eminente. Precisamos sim desses chatos, que nos abrem os olhos ou nos despertam raiva. Eles (pessoalmente) me fazem olhar pros meus egoismos, me fazem querer levantar da minha vida futon, me despertam culpa e reflexão. Nesse grupo (dos ativistas, ciclolovers e ecochatos)  existem alguns que considero insuportáveis, que colocam ideias com aquela arrogância intelectual que é pura cópia daquele elistismo que tanto criticam, que falam do paradoxo dos que louvam o Mandela mas criticam o rolexzinho, e que na mesma mensagem falam mal de quem erra português, e pior, corrigem o portugûes dos outros. Ou seja, criticam o paradoxo sendo paradoxais.

Penso então, no quanto clamo por pessoas assim, com capacidade de olharem pro mundo sem serem enganadas e que cheguem para nos alertar, sem ostentação, sem falar que o outro é isso ou aquilo, como se nunca tivesssem sido um pouco daquilo que tanto criticam, torço por mais gente discursando sobre algo sem se esquivar, se incluindo na zona de mudança. Esse vácuo entre o discurso e a prática, como se nunca tivesse ocorrido uma transformação, esse ponto cego sempre me incomodou, por isso mesmo quando leio textos esclarecedores, que abrem meus olhos, eu procuro não ativar meu gatilho do “esquerdista sagaz arrogante” sobre quem não sabe o que eu sei, eu penso com orgulho e vergonha sobre o que pensava antes. Penso que eu sou esse cara da classe média aí do texto, infelizmente, e mesmo que involuntariamente, mesmo que sem querer, começo a me lembrar com lamento que já fechei um vidro para alguém que julguei ser mal encarado, mas eu prefiro e me sinto mais aliviado trocar o “não sou esse” pelo “não quero ser MAIS esse”.

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benesi* EDUARDO BENESI é Pedagogo, consultor cultural, formou-se também no teatro para atuar escrevendo. É um hispster inconfidente que carrega bandejas com cebolas gigantes para viajar o mundo, e o seu rodizio é de terça-feira. Pede tudo sabor queijo, da abraço demorado e tem um site em que coleciona pessoas e instantes: o www.favoritei.com.br